Com a crescente crise ambiental e a urgência em proteger os recursos naturais, a comunidade internacional tem se mobilizado para preservar nossos ecossistemas. Um dos esforços mais ambiciosos é a iniciativa 30×30, que visa proteger 30% do planeta, incluindo terra e mar, até 2030. No entanto, alcançar essa meta tem sido um desafio, especialmente para nações com recursos limitados. Uma pesquisa da Universidade da Califórnia – Santa Bárbara (UCSB) propõe uma abordagem inovadora: um mercado de créditos de conservação que pode facilitar a implementação dessa iniciativa.
O Desafio da Iniciativa 30×30
A Convenção sobre Diversidade Biológica, um tratado multilateral criado na década de 1990, incorporou a meta 30×30 como um de seus principais objetivos. O tratado busca a proteção eficaz de áreas terrestres, de água doce, costeiras e marinhas. Essa proteção é vital para garantir a saúde a longo prazo do nosso planeta. Contudo, a implementação desse plano esbarra em desafios econômicos significativos. Cada país deve definir quais áreas proteger, como financiar essas proteções e como fazê-lo de forma inclusiva.
O estudo publicado na revista Science por três pesquisadores da UCSB explora uma solução potencial para esses desafios: a criação de um mercado de créditos de conservação. Essa abordagem permitiria que países negociassem seus compromissos de conservação, ajustando os custos e maximizando os benefícios ecológicos.
O Conceito de um Mercado de Conservação
O mercado de conservação é inspirado em outros sistemas de comércio, como os de créditos de carbono, onde países ou empresas podem comprar e vender permissões de emissão. No contexto da conservação, essa abordagem permitiria que nações com custos mais baixos de proteção assumissem maiores responsabilidades em troca de compensação financeira de países com custos mais altos.
O professor Christopher Costello, coautor do estudo e diretor do Laboratório de Mercados Ambientais da UCSB (emLab), explica: “Em vez de exigir que cada país proteja exatamente 30% de seu próprio habitat marinho, permitimos que esses compromissos sejam negociados entre nações, dentro de restrições ecológicas rigorosas”. Isso significa que um país como a Noruega, que possui pesqueiras valiosas, poderia pagar a um país como Palau para conservar áreas adicionais, cumprindo assim suas obrigações de conservação de forma mais econômica.
Custos e Benefícios Variáveis
Os custos de conservação variam significativamente entre diferentes regiões do mundo. Áreas com altos valores de pesca podem coincidir com ecossistemas marinhos importantes, como recifes de coral e florestas de algas, tornando a conservação nesses locais particularmente cara. Por outro lado, outras regiões podem fornecer benefícios de conservação significativos a um custo muito menor. Essa variabilidade cria oportunidades para o comércio de compromissos de conservação, onde países podem focar em proteger áreas que oferecem o maior retorno ecológico por um custo reduzido.
Villaseñor-Derbez, coautor do estudo, observa que sem uma abordagem inovadora de política, os altos custos de conservação podem impedir o progresso da iniciativa 30×30. O mercado de conservação pode ajudar a equilibrar esses custos, permitindo que países com recursos limitados participem efetivamente da proteção global dos oceanos.
Modelagem e Resultados
Os pesquisadores desenvolveram um modelo para simular os possíveis custos e benefícios de um mercado de conservação. Eles combinaram dados de 23.699 espécies marinhas e informações sobre receitas pesqueiras para criar curvas de oferta de conservação para nações costeiras. A análise mostrou que, independentemente das restrições aplicadas ao mercado, os custos da conservação foram sempre reduzidos, com economias variando entre 37,4% e 98%.
Para garantir uma distribuição equitativa dos esforços de conservação, os pesquisadores definiram “bolhas comerciais” baseadas em fatores biológicos e geográficos. Essas bolhas permitiriam a negociação de créditos de conservação dentro de domínios específicos, como hemisférios ou ecorregiões, prevenindo a concentração excessiva de esforços em apenas um tipo de habitat marinho.
Vantagens para Nações em Desenvolvimento
Uma preocupação potencial com esse sistema é que nações ricas possam simplesmente “pagar” para transferir suas obrigações de conservação para países mais pobres. No entanto, o mercado é projetado para ser voluntário, permitindo que cada país decida se o comércio é vantajoso para eles. Para países em desenvolvimento, essa abordagem pode oferecer uma fonte valiosa de financiamento para a conservação. Em vez de serem obrigados a proteger 30% de suas águas sem recursos adequados, eles poderiam vender parte de suas obrigações a países mais ricos, utilizando os recursos obtidos para fortalecer suas economias e melhorar suas capacidades de conservação.
Incentivo à Restauração de Habitat
Além de ajudar a atingir as metas 30×30, um mercado de conservação também poderia promover a restauração de habitats, que é a meta número 2 do Quadro Global de Biodiversidade (GBF). Países focados na exploração de recursos poderiam compensar aqueles que se especializam na conservação, criando um equilíbrio onde todos saem ganhando.
Costello ressalta que, diferentemente do sistema atual, onde raramente há pagamento para a conservação, esse mercado ofereceria um incentivo explícito para proteger os ecossistemas marinhos. Isso poderia impulsionar ações de conservação em uma escala sem precedentes, contribuindo significativamente para a saúde dos oceanos e para a sustentabilidade global.
O sistema proposto de créditos de conservação representa uma abordagem econômica e estratégica para a conservação marinha. Ao permitir que países negociem suas obrigações de conservação, o mercado pode reduzir os custos e incentivar ações que de outra forma seriam economicamente inviáveis. Com o mundo enfrentando desafios ambientais cada vez mais graves, essa solução inovadora pode ser crucial para alcançar as metas ambiciosas da iniciativa 30×30 e garantir um futuro sustentável para nossos oceanos.